Enciclopedia jurídica

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Salário-educação

Imposto destinado ao “ensino fundamental público como fonte adicional de financiamento, recolhido, na forma da lei, pelas empresas que poderão deduzir a aplicação realizada no ensino fundamental de seus empregados e dependentes” (CF, art. 212, § 5.o).

Salário-educação (1)
Período entre outubro de 1964 até dezembro de 1996 Contribuição instituída pela Lei n° 4.440, de 27 de outubro de 1964, tendo como contribuintes as empresas vinculadas à Previdência Social. Em que pese à jurisprudência do STF tê-la considerado como de natureza não tributária, entendo tratar-se de gravame de natureza tributária, máxime porque sua tipologia revela tratar-se de prestação originalmente pecuniária, instalada compulsoriamente, a qual não traduz penalidade e foi criada por pessoa constitucional, conforme quer o regime tipificador dos tributos, independentemente de definição preceituada em Emenda Constitucional ou por qualquer diploma subconstitucional. Com efeito, a lei retrocitada se limitou a criar abstratamente o gravame, delegando ao Executivo a incumbência de fixar a base de cálculo e a alíquota correspondente, o que foi efetivado por meio do Decreto n° 55.551, de 12 de janeiro de 1965, o qual firmou a alíquota de 2% sobre o salário mínimo de adulto. Por todas as veras, a mencionada contribuição já nascera à mingua de lastro constitucional, tanto que o art. 168, da Constituição de 1946 se limitava a obrigar as empresas a manter o ensino primário gratuito aos seus servidores ou respectivos filhos ou ainda a ministrar a aprendizagem aos trabalhadores menores. Ora, uma estipulação de conteúdo programático poderia, quando muito, ensejar a edição de normação integrativa correspondente, não representando, jamais, um título que instrumentasse a União a instituir uma prestação compulsória sob pretexto de implementar aquele mandamento.Outrossim, merece repudiado, de logo, o argumento dos prosélitos da suposta legitimidade dessa legislação, quando invocam que o salário-educação não teria natureza tributária, porquanto seria facultado ao empresário oferecer o ensino ou recolher o gravame. Tal alegação afigura-se descabida, pois equivaleria a dizer que o imposto sobre a renda não é tributo em virtude dos incentivos que permitem ao contribuinte optar por um dado investimento em vez de recolher o imposto. Urge dizer alto e bom som que o regime jurídico tipificador do tributo consiste numa prestação originalmente pecuniária, instalada compulsoriamente, que não seja penalidade e instituída por pessoa constitucional, a exemplo do perfil da contribuição em apreço. Com efeito, o salário-educação exsurgiu eivado de nulidade pleno jure e com essa coima permanecera até o advento do Decreto- lei n° 1.422, de 23 de outubro de 1975, já à luz da Carta de 1967, o qual modificou a legislação sobre a matéria estabelecendo como base de cálculo a folha de salários, enquanto delegou ao Executivo o mister de estipular a alíquota respectiva. De seguida, foi editado o Decreto n° 76.923, de 26 de dezembro de 1975, o qual em seu art. 15 estatuiu a alíquota de 2,5%. Obviamente, essa legislação navegava na contramão do Código Supremo, o qual proclamou o postulado da estrita legalidade como pressuposto impostergável na seara da tributação, cujo teor repudiava aquela forma de delegação legislativa, permitindo apenas o estabelecimento de alíquotas e base de cálculo em relação ao imposto sobre a importação e exportação, bem assim o imposto sobre produtos industrializados e o imposto sobre operações de crédito, câmbio, seguro ou relativas a títulos ou valores imobiliários, mesmo assim nos limites previamente fixados em lei. Por conseguinte, nem os tributos exceptuados do rigor da estrita legalidade mereceram o tratamento atribuído pelo Decreto-lei ora questionado, o qual se afigura decididamente inconstitucional. Ao demais, o art. 43, X, do aludido Diploma Magno não incluiu a contribuição salário-educação no rol daquelas contempladas na ordem constitucional de antanho. Ao lado dessas vicissitudes, é bem de ver que a referida contribuição se ressentia também de título competencial que legitimasse a sua estatuição. Tal estado de coisas se deu até agosto de 1996, quando sobreveio a Medida Provisória de n° 1.518, de setembro de 1996, sucessivamente reeditada em outubro e novembro do mesmo ano. a qual não foi convertida em lei como exige o parágrafo único do art. 62 da Constituição de 1988. Logo, as referidas Medidas permaneceram órfãs, falecendo, portanto, de qualquer idoneidade para produzir efeitos jurídicos, nos angustos termos do quanto dispõe o comando retrocitado. Sobremais, as Medidas in casu cogitaram de matéria que fora alvo de matéria alterada por meio da Emenda Constitucional n° 14, de 12 de setembro de 1996, fato, que por si só, obsta seja o assunto versado por Medida Provisória, consoante prescreve com todas as luzes o art. 246 do Texto Magno. Entrementes, por maioria de votos, vencido o Ministro Marco Aurélio, o Tribunal Pleno do Pretório Excelso passou ao largo das considerações ora expendidas e reconheceu a conformidade do gravame com o Texto Supremo. Fê-lo ao decidir o Recurso Extraordinário n° 2900/79-SC, em julgamento realizado no dia 17 de outubro de 2001, tendo por Relator o Ministro limar Galvão, cuja publicação se dera em 4.4.2003, no Diário da Justiça da União, conforme estampa a Ementa a seguir transcrita:
“Ementa: Tributário. Salário-educação. Período Anterior à Lei n° 9.424/96. Alegada Inconstitucionalidade, em Face da EC 01/69, Vigente quando da Edição do Decreto-lei n° 1.422/75, por Ofensa ao Princípio da Estrita Legalidade Tributária, Consagrado nos arts. 153, § 2o, e 178, e ao Principio da
Vedação da Delegação de Poderes, Previsto no art. 6o, parágrafo único. Alegada Contrariedade, ainda, ao art. 195, I, da CF/88. Contribuição que, de Resto, fora Revogada pelo art. 25 do ADCT/88. Contribuição que, na vigência da EC 01/69, foi considerada pela jurisprudência do STF como de natureza não tributária, circunstância que a subtraiu da incidência do princípio da legalidade estrita, não se encontrando, então, na competência do Poder Legislativo a atribuição de fixar as alíquotas de contribuições extratributárias. O art. 178 da Carta pretérita, por outro lado, nada mais fez do que conferir natureza constitucional à contribuição, tal qual se achava instituída pela Lei n° 4.440/64, cuja estipulação do respectivo quantum debeatur por meio do sistema de compensação do custo atuarial não poderia ser cumprida senão por meio de levantamentos feitos por agentes da Administração, donde a fixação da alíquota haver ficado a cargo do Chefe do Poder Executivo. Critério que, todavia, não se revelava arbitrário, porque sujeito à observância de condições e limites previstos em lei. A CF/88 acolheu o salário-educação, havendo mantido de forma expressa - e, portanto, constitucionalizado -, a contribuição, então vigente, a exemplo do que fez com o PIS-Pasep (art. 239) e com o Finsocial (art. 56 do ADCT), valendo dizer que a recepcionou nos termos em que a encontrou, em outubro/88. Conferiu-lhe, entretanto, caráter tributário, por sujeitá-la, como as demais contribuições sociais, à norma do seu art. 149, sem prejuízo de havê-la mantido com a mesma estrutura normativa do Decreto-Lei n° 1.422/75 (mesma hipótese de incidência, base de cálculo e alíquota), só não tendo subsistido à nova Carta a delegação contida no § 2o do seu art. Io, em face de sua incompatibilidade com o princípio da legalidade a que, de pronto, ficou circunscrita. Recurso não conhecido.”
Salário-educação (2)
Período a contar de janeiro de 1997 em diante
Ao depois, foi promulgada a Lei n° 9.424, de 24 de dezembro de 1996, a qual não se escoima de incontáveis impropriedades, conforme será obtemperado nos desdobres destas reflexões. Em primeiro lugar, cabe ponderar que a Lei sub examen hospeda conteúdo diverso ao das Medidas Provisórias prefaladas, donde, por mais essa razão, aquelas Medidas perderam a eficácia, por ausência de lei de conversão. Tal fato compromete também a pretensa validade da referida lei, porquanto não sendo lei de conversão, seria de mister fosse ela submetida ao procedimento legislativo insculpido na Constituição. Deveras, a lei não pode exsurgir inopinadamente, do nada, a exemplo do caso vertente, devendo, ao revés, subordinar-se aos ditames contidos nos arts. 61 e seguintes da Constituição, a contar do projeto de lei até o estádio derradeiro substanciado na promulgação e publicação. A Lei n° 9.424/96, ao contrário do quanto exige a ordem jurídica, descumpriu as trajetórias previstas no figurino constitucional, pois não derivou de Medida Provisória, aliás, nem poderia, senão também não defluiu de projeto de lei, restando assim maculada em sua validez. Em segundo lugar, a Lei ora discutida inobservou o postulado da estrita legalidade, máxime porque, além de não exaustar a descrição da norma de incidência, delegou poderes ao Executivo para fazê-lo, em flagrante afronta ao referido princípio constitucional. A opinião ora exposta vem merecendo acolhida por parte do Judiciário Federal, no particular o TRF da 3a Região, a teor do despacho contido no Agravo n° 97.03.015697-5, no qual foi Relatora a Juíza Lucia Figueiredo que, como sempre, em exemplar pronunciamento repudiou a exigibilidade da aludida contribuição. Vejamos um breve excerto de sua decisão: “Há, pois, plausibilidade da relevância da argumentação, vez que, como acentuado, alguns aspectos da hipótese de incidência estão previstos em legislação com vigência definitiva, Lei n° 9.424/96, outros com vigência temporária (MP n° 1.565-2/97). E, ainda, poder-se-ia cogitar da materialidade do fato imponível. De outra parte, presente também o perigo da demora, caso o pagamento seja efetuado. Assim, concedo provisoriamente o efeito pretendido pela impetrante, nos termos do art. 558 do Código Processual Civil, até que a turma se pronuncie” (DJU 2 de 14.4.97, p. 23.372). Outrossim, a matéria seria privativa de legislação complementar, seja por tratar-se de contribuição cujos elementos essenciais não encontram- se descritos no Texto Excelso, seja por tratar-se de tributo, cujo interesse transcende ao da União Federal, até porque uma parcela de suas receitas se destinam aos Estados, fato que igualmente exige legislação complementar, conforme as lições abalizadas de Souto Maior Borges (Lei Complementar Tributária, São Paulo, RT, 1975, pp. 174 e ss.). Demais disso, a referida lei atribui um verdadeiro cheque em branco em prol do administrador dos fundos a que se destinam os recursos provenientes do salário-educação. Nesse sentido, estatuiu que a quota federal, bem assim a estadual serão aplicadas em programas genéricos e abertos, agredindo, dessarte, os postulados orçamentários da legalidade estrita e da especialização, os quais não se compaginam com a existência de conceitos elásticos próprios dos atos discricionários. Por derradeiro, verifica-se ofensa ao princípio da isonomia, uma vez que as municipalidades não foram aquinhoadas com quaisquer quotas, diferentemente da União e dos Estados que receberam as respectivas quotas federal e estaduais. Por todas essas observações, força é depreender que a contribuição para o salário-educação abriga manifesta inconstitucionalidade, a contar de janeiro de 1997 em diante. Embalde o exposto, ao julgar a ADC 3-DF, o Plenário do Supremo Tribunal Federal declarou a constitucionalidade dos comandos intersertos na Lei n° 9.424, de 24 de dezembro de 1996, os quais estabeleceram o novo perfil do salário-educação. A Segunda Turma da Suprema Corte, de seu turno, em decisão abrangente tornou a proclamar a constitucionalidade do salário-educação anterior e posterior ao advento da Carta de 1988, reportando-se, a bem ver, ao decisum constante na ADC supramencionada. Vejamos sua Ementa:
“Ementa: Constitucional. Salário-educação: Legitimidade de sua Cobrança antes e após a CF/88.1 - O Supremo Tribunal Federal, pelo seu Plenário, julgando procedente pedido formulado em ação declaratória de constitucionalidade, declarou a ‘constitucionalidade, com força vinculante, com eficácia erga omnes e com efeito ex tunc, do art. 15, § Io, incisos I e II, e § 3o da Lei n° 9.424, de 24/12/96\' (ADC 3-DF, Ministro Nelson Jobim, \'D.J.\' de 14.12.1999). Frise-se, ainda, que o Supremo Tribunal Federal, pelo seu Plenário, não conheceu do recurso extraordinário, interposto pelo contribuinte, que versava a respeito da cobrança da contribuição do salário-educação posteriormente à Lei 9.424/96 (RE 272.872/RS, Relator Ministro limar Galvão, ‘D.J.’de 19.4.2001). Finalmente, em 17.10.2001, o Supremo Tribunal Federal, pelo seu Plenário, não conheceu do recurso extraordinário, interposto pelo contribuinte, em que se questionava a cobrança da citada contribuição na vigência da Constituição Federal de 1988, mas em período anterior à Lei 9.424/96. E dizer, o Supremo Tribunal Federal, no citado julgamento, deu pela constitucionalidade do DL 1.422/75, art. Io, §§ Io e 2o, e pela recepção, pela C.F./88, da alíquota de 2,5% fixada pelo Decreto 87.043, de 22.3.82, que perdurou até ter vigência a Lei 9.424, de 24.12.96 (RE 290.079/SC, Relator Ministro limar Galvão). II - Caso em que deve ser a agravante condenada ao pagamento de multa: CPC, art. 557, § 2o, redação da Lei 9.756/98. Ill - Agravo não provido (DJ de 7.5.2004, Ementa vol. 2.150-13, p. 92.605).
Salário-educação (3)
Prestadoras de serviços
Tirante as impropriedades contidas no salário-educação com relação às pessoas jurídicas em geral, as prestadoras de serviços não poderiam ocupar o pólo passivo desse gravame, ao menos até dezembro de 1996. Justifica o asserto a circunstância pela qual a ordem constitucional de antanho contemplava como sujeito passivo do salário-educação tão-somente as empresas industriais, comerciais e agrícolas, seja no art. 168, inciso III, Carta de 1946, seja no art. 178 da Lex Legum de 1967 e Emenda n° 1, de 1969. E dizer, a inclusão da prestadora de serviço no pólo passivo da relação jurídica traduz usurpação de competência, porquanto instituída à míngua de título idôneo no Texto Supremo. Não obstante, a orientação pretoriana fez tábula rasa da aludida ponderação, tanto que reconheceu a exigibilidade da contribuição para o salário- educação em relação às empresas em geral, inclusive as prestadoras de serviço, embora não tenha apreciado ou contestado o argumento atinente a ausência de lastro constitucional que autorizasse qualificar as prestadoras como sujeitos passivos do aludido gravame.


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